O mundo astronômico está atônito para a grande conjunção dos planetas
Júpiter e Saturno, que ocorrerá no dia 21 de dezembro, durante o solstício
de verão. Entretanto, alguns veículos de comunicação estão chamando o evento
de "estrela de Belém". Afinal, qual a relação desse astro bíblico com a
grande conjunção?
"Tendo, pois, nascido Jesus em Belém de Judá, em tempo do Rei Herodes, eis
que vieram do Oriente uns magos a Jerusalém, dizendo: "Onde está o Rei dos
Judeus, que é nascido? Porque vimos no Oriente sua estrela e viemos
adorá-lo'."
O trecho acima, que encontra-se no livro de Mateus, na Bíblia Sagrada,
conta a aparição de um astro, a famosa "estrela de Belém".
Muitas foram as hipóteses - considerando essa passagem como um fato
histórico - que tentaram explicar a aparição desse astro nos céus do Oriente
Médio, incluindo a suposição da passagem do cometa Halley.
O grande divulgador da Astronomia brasileira, Ronaldo R. R. Mourão, em seu
maior livro, "O Livro de Ouro do Universo", dedicou uma parte de sua obra à
estrela de Belém. Ele explica que, no Século VIII, o monge cronologista e
históridor inglês, Bede, em seu livro "História eclesiástica dos ingleses",
de 731, indica que o astro não poderia ser um cometa, pois o astro visto
pelos reis magos estava na direção sul. Um cometa jamais se desloca para o
Sul. A explicação era frágil, e não convenceu.
De fato, a última passagem do cometa Halley, antes de Jesus ter nascido,
foi no ano 12 a.C., no dia 25 de agosto, e foi relatada por astrônomos
chineses. Apesar dos presépios mostrarem a imagem semelhante a de um cometa,
o astro em questão está descartado historicamente.
Mourão ainda levanta a hipótese do astro ser uma "nova" ou uma "supernova".
A primeira, como o nome sugere, é o aparecimento de uma nova estrela no céu.
A segunda, é a explosão violenta de uma estrela de grande massa, que ilumina
os céus durante dias ou anos, e, por um instante, gera uma luz maior que a
própria galáxia. Uma nova foi registrada pelos chineses em 24 de abril de 4
a.C., na Dinastia Han.
Mais tarde, o astrônomo da idade média Johannes Kepler, em 1623, lançou a
hipótese de que a estrela de Belém seria uma conjunção planetária de Júpiter
e Saturno com a constelação de Peixes (na qual ele chamou de "tripla
conjunção" ocorrida em 7 a.C., e foi confirmada, no século XIX, pelo
astrônomo inglês C. Pritchard. Segundo ele, ocorreram três conjunções entre
os planetas no ano de 7 a.C.: 29 de maio, 29 de setembro e 4 de dezembro, na
direção da constelação de Peixes, que é astrologicamente ligada ao povo
Judeu.
Como explica Mourão, "toda hipótese submetida à luz da ciência deixou uma
dúvida sobre a data de nascimento de Cristo, que os próprios peritos
cristãos são unânimes em afirmar que teria ocorrido sete anos antes da data
atualmente aceita".
Céu de Jerusalém no dia 04 de dezembro do ano 7 a.C.. É possível ver uma
conjunção que poderia ter sido observada pelos reis magos.
De fato, se ajustarmos o software Stellarium, por exemplo, para o ano
de -6 e para o dia 4 de dezembro, veremos no simulador uma
conjunção entre os planetas Júpiter e Saturno, entretanto, com uma distância
angular maior do que a que será registrada em 21 de dezembro de 2020, com
uma separação de apenas 6.1 arco minutos, uma espetáculo que faria inveja
até mesmo aos reis magos, e que realmente aparecerá quase como uma "segunda
estrela" no céu poente, apesar de que, a olho nu, ainda pode-se ver a
separação dos planetas no céu.
O próprio Galileu Galilei, por exemplo, não pode sequer ver uma conjunção
do tipo com seu telescópio recém fabricado, pois, na última vez que esse
fenômeno ocorreu, os planetas estavam próximos ao sol, portanto, invisíveis
a olho nu.
A próxima grande conjunção ocorrerá em 2080. A menos que esteja nublado em
sua região, esta é uma chance única de sua vida para ver um grandioso evento
que pode ter sido inspiração para autores da bíblia e que está provocando
ansiedade generalizada no mundo astronômico, pela majestade que ele
será.
Referências:
Burke-Gaffney, W. (1937). "Kepler and the Star of Bethlehem". Journal of the Royal Astronomical Society of Canada. 31: 417.
MOURÃO, R. R. de F. O Livro de Ouro do Universo. Ediouro,
2000.
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